terça-feira, 29 de outubro de 2002

Dez coisas que todas as mulheres sabem (mesmo sem saber)


1. Todas as mulheres sabem que no fundo de si mesmas moram muitas outras
figuras femininas. Algumas poderosas, outras frágeis; algumas velhas, outras
bem jovens. Todas adoram falar e falar, como se o mundo antes de existir,
precisasse ser dito.

2. Todas as mulheres conhecem a dor e nenhuma é estranha ao sofrimento. Mas, no
final, quando a noite se retira solene, carregando seu véu, a maioria de nós
espreguiça e recebe o dia com generosidade renovada e a mesma velha esperança
sorrindo nos lábios.

3. Todas as mulheres um dia (ou muitos) se sentiram alheias a si mesmas. E
perderam-se num mar de irritação, mau-humor e impaciência. Exaustas mergulharam
num Lexotan, em vários copos de vinho, num maço inteiro de cigarros, numa
banheira escaldante ou no mais puro desespero. Algumas sucumbiram, só algumas.
Como resultado, todas nós carregamos no coração o silêncio desta perda. E
reconhecemos com reverência o poder destes abismos.

4. Todas as mulheres, mesmo as muito jovens, sabem que ser mulher é um desafio.
Ou sentem isso no próprio corpo. E no mínimo desconfiam que vão passar um
bocado de tempo tentando provar coisas para o mundo. Nascer mulher, em boa
parte do planeta, ainda é afirmar-se acima do destino biológico e apesar das
circunstâncias.

5. Todas as mulheres pensam que sabem amar. Mas o amor insiste em rir de nós. E
desafia nossas desajeitadas tentativas de dominá-lo ou compreendê-lo. O amor
parece um gato que só vem para o nosso colo quando nós já cansamos de chamar.
Aí, a gente ri e ele ronrona sua absurda liberdade enquanto recebe nosso afago
no pescoço. Mas que ninguém se iluda, mal a gente se acostuma com aquele calor
macio e peludo e ele pula de volta prá vida.

6. Nenhuma mulher deseja a felicidade assim de um jeito genérico. É o
encantamento que sentimos quando cumprimos nosso destino de mulher que nós
buscamos acima de tudo. E isto inclui muitas coisas bobas, como vestidos novos
e cores e mais cores de sapatos, e tantas outras nada bobas, como filhos
rechonchudos e gracinhas e......ele. De preferência, um ele apaixonado, mas não
muito, bonito, mas não muito, inteligente, mas não muito, apaixonado por
crianças, mas não tanto quanto por nós, e, o toque final: que surja sempre
assim com aquele jeito heróico e descabelado de quem acabou de matar um dragão,
por nós.

7. Todas as mulheres têm medo. Medo do primeiro beijo, do primeiro encontro, do
primeiro emprego, medo de casar, medo de não casar, medo do parto, medo da
traição, medo de não conseguir, medo de envelhecer, medo de dizer sim. A cada
instante, nossos medos podem nos fazer trancar os dentes, afinar o olhar e
ousar o salto. Ou podem nos empurrar encolhidas para dentro de uma caixa de
sapatos. Onde ficamos grudadas, olhando o mundo por um buraquinho...

8. Todas nós temos um sonho. Nem sempre é um daqueles sonhos nobres, como o de
Martin Luther King, que ansiava por um mundo no qual os seres humanos fossem
iguais em suas múltiplas e coloridas versões. Não, nossos sonhos muitas vezes
são pequenos como um jardim ou um carinho. Engraçados: usar toda a poupança
para ficar com um bumbum igual ao da beldade de plantão na TV. Românticos: um
cruzeiro pela Grécia, com um grego lindo e de peito largo, absolutamente
apaixonado por nós. Impossíveis: passar pela vida sem sofrer por amor.

9. Todas nós temos uma sombra. Negra e densa. Ora ela aparece como um
sabotador, que mina nossas energias e desmerece nossos esforços. Ora como uma
mulher dura e fria, de palavras ásperas e julgamento impiedoso. Não importa
como ela venha, você vai reconhecê-la sempre: a sombra tem o seu rosto. Também
é fácil reconhecer aquelas entre nós que não ousaram olhar de frente para este
rosto transformado. Elas parecem árvores ressequidas e seus ramos balançam sem
alegria. Quem se alimenta dos frutos murchos destas árvores experimenta seu
sabor ressentido e intolerante. Eventualmente, as tempestades partem ao meio
troncos tão secos. Ninguém sente muita falta delas.

10. Todas nós sentimos vez por outra uma vontade parar de bater as asas na
vidraça e aquietar a alma. Esta é a hora de construir um templo para acolher
nosso ser feminino. Um lugar onde a gente possa ficar só com nossos mistérios,
nossas descobertas e pescar no fundo da alma o encantamento que vai nos tornar,
de novo, tão orgulhosas de nós mesmas.

(Adília Belotti)

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